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Deu a louca

Copa Gay de Manaus é chute no preconceito

Torneio de futebol amador reúne uma turma que, definitivamente, merece a camisa 10

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Depois de sediar a Copa do Mundo, Manaus recebeu outra Copa (Foto: Winnetou Almeida/A Crítica)
Depois de sediar a Copa do Mundo, Manaus recebeu outra Copa (Foto: Winnetou Almeida/A Crítica)

(*) Esta matéria, do repórter Leanderson Lima e do fotógrafo Winnetou Almeida, do jornal A Crítica, de Manaus, venceu o Prêmio Petrobras de Jornalismo de 2015, como a melhor reportagem de esportes da região Norte/Centro-Oeste/Minas Gerais. Gentilmente, Leanderson cedeu o conteúdo para a republicação no Verminosos.

Depois de sediar a Copa do Mundo, Manaus recebe outra Copa. É verdade que essa não tem a mesma estrutura do torneio organizado pela Fifa. A vantagem é que ninguém precisa sofrer para comprar ingressos pela internet, porque o espaço é gratuito e bem mais democrático.

No que diz respeito ao gramado… Bom, esqueça o tapete verdinho e bem cuidado. Aqui o campo é de várzea. Tem areia e pedrinhas capazes de machucar pés sensíveis que não calçam chuteiras.

Aqui também não tem camarote como na Arena da Amazônia, e nem Buffet com pratos sofisticados. Sem problemas. “Cléo Pires” anuncia com um microfone ligado a uma caixa amplificada o “cardápio” da tarde. “Quem quiser comprar estamos vendendo bolo e refrigerante”.

Enquanto isso o time “Mulheres de Ferro do Coroado” faz aquecimento no galpão que fica ao lado do campo. A equipe rival, “Damas de Ferro”, prefere cuidar do visual.

Membros de outros times batem bola no campo até que um chute ao melhor estilo Roberto Carlos atinge o telhado de alumínio do galpão ao lado da quadra. O petardo virou motivo de piada entre os participantes da Copa: “Gente isso não é um fresco é uma machuda”, brincou um dos jogadores arrancando gargalhadas dos atletas.

O relógio marcava perto das 15h. O sol é forte, incomoda. “Kyara Glembova” usa uma toalha para enxugar o suor. “E também para preservar a pele”, avisa para a reportagem.

“Pedrita” se dirige até o centro do campo a pedido dos demais colegas. Eles queriam que ele desse pontapé inicial na primeira Copa Gay de Futebol do Amazonas, afinal de contas, a idéia foi dele.

Bola tocada. O sorriso estampado no rosto denunciava a felicidade de “Pedrita” pelo feito histórico. Do lado de fora, “Cléo Pires” continua como locutor oficial agora anunciando: “Preparem-se que os Jogos Vorazes vão começar”!

E o jogo começa.

Não é porque é uma Copa Gay que o jogo vai ser “delicado”. Pelo contrário. A partida é dura. Chutes fortes, marcação cerrada e até um “pé alto” que acerta um dos jogadores. O árbitro marca falta e não dá cartão. “Kyara” se irrita: “É pra bater? Se for a gente também sabe bater”.

A partida fica tensa.

Pouco depois os gols começam a sair. Um atrás do outro. E o time “Mulheres de Ferro do Coroado” vence com relativa facilidade: 5 a 1. O grande astro da partida é Felipe Silva, mas pode chamar de “Bionda”.

Ele tem habilidade de sobra e um cabelo ao melhor estilo Cristiano Ronaldo. E como o CR7, ele ainda fez o seu “hat-trick”, ou seja, anotou três gols em cima do “Damas de Ferro”.

Esqueça o tapete verdinho e bem cuidado. Aqui o campo é de várzea. Aliás, é terra mesmo (Foto: Winnetou Almeida/A Crítica)
Esqueça o tapete verdinho. O campo é de várzea. Aliás, é terra mesmo (Foto: Winnetou Almeida/A Crítica)

“Bionda” deixou seu hat-trick

“A gente sempre joga no Coroado com os machos mesmo. Às vezes a gente ganha e vamos pra cima”, comenta. “O jogo foi duro. É rivalidade é intriga… É um mexendo com o outro o tempo inteiro, mas no final todo mundo se cumprimenta”, destaca.

Para “Bionda”, a vitória já coloca o time entre os favoritos no torneio. “Já dá para sonhar com o título”, dispara para em seguida revelar quais são os times que moram em seu coração: “Flamengo e São Raimundo”.

Segundo jogo da rodada. É a vez do time “Ball Cats” entrar em ação contra o mesmo, “Damas de Ferro”.

O “Ball Cats” conta com “Pedrita” e “Cléo Pires” no elenco. A entrada em campo é apoteótica. “Cléo” inclusive vem de salto alto no sentido literal da palavra.

O time perde por 4 a 3, mas isso não é motivo de tristeza, até porque, os jogos do sábado ainda tinham caráter amistoso. O bicho vai pegar mesmo no próximo sábado, às 19h, quando o campeonato começa pra valer.

Cléo Pires entra literalmente de salto alto em campo (Foto: Winnetou Almeida/A Crítica)
Cléo Pires entra literalmente de salto alto em campo (Foto: Winnetou Almeida/A Crítica)

Uma história de amor ao futebol

Idealizador da Copa Gay, Pedro Leocádio, o “Pedrita”, tem uma história de amor com o futebol desde que era criança. “Sempre joguei no meio dos homens e sempre gostei de homem também. Nunca escondi”, revela.

Ele conta que sofreu preconceito no mundo do futebol ao assumir ser homossexual. “Quando tinha 17 anos fui jogar num time do bairro, mas o dono da equipe me expulsou dizendo que não queria veado no time dele. Foi horrível. Foi o maior preconceito que sofri em toda a minha vida”, revela.

A grande virada aconteceu por conta de um conhecido chamado Raul, que convocou o atacante Pedro para o time dele. E o craque das peladas não decepcionou. “Fui artilheiro do campeonato e ainda tirei o time daquele cara que me expulsou, na semifinal”, conta.

Foi justamente neste torneio que ele ganhou o apelido que carrega até hoje, “Pedrita”. “Naquele campeonato ganhei um troféu lindo. Então olhei para o dono do time e disse: ‘Agora você vai para arquibancada torcer por mim, seu veadinho”, contou.

Pedro, ou melhor, “Pedrita”, cresceu, disputou vários torneios de futebol amador e se tornou um dos jogadores mais requisitados do bairro. E ele leva a carreira com muito profissionalismo. “Nunca fiquei com um colega de time. E todos me respeitam. Às vezes nem de Pedrita eles me chamam”.

É nas comemorações dos gols que “Pedrita” mais chama atenção. “Eu rebolo, danço, faço espaguete, caminhada de gato…”. Fora das peladas, ele ganha a vida como bancário e instrutor de legislação em uma auto-escola. “Sou 2014 utilidades”, brinca.

‘Divas’ em ação

O time “Damas de Ferro” contou com uma participação especialíssima “Kyara Glembova”, a musa da Liga Gay de Vôlei, uma das mais tradicionais da cidade. Foi a primeira vez que a musa entrou em campo.

“Esse foi o meu primeiro jogo. É muito bom estar jogando com as minhas amigas, com as conhecidas. Eu jogo vôlei, mas não participo da Liga Gay de Vôlei. Meu negócio é participar dos concursos de beleza”, afirma “Kyara”, que aos 28 anos, também já foi Miss Gay Cidade Nova, bairro da zona Norte de Manaus.

Júnior Souza, mais conhecido como “Cléo Pires”, também estava debutando no futebol assim como “Kyara”. Este “zagueirão” ainda explicou para a reportagem a origem do apelido. “Basta olhar para mim que você vai ver que eu sou idêntica a Cléo Pires. A Globo me chamou para ser dublê dela. A Cléo Pires cobra muito caro para aparecer nua na novela e eu cobro mais barato”, brinca.

“Cléo” torce pelo Corinthians, gosta de assistir futebol e agora começou a praticar a modalidade. “Primeiro estamos fazendo a parte de socialização e vendo como vai ser para atrair o público. A maioria dos gays joga vôlei ou queimada e a gente quer mostrar que tem muito gay que gosta de outras coisas, principalmente de futebol”, opina.

Mais do que a socialização ou a oportunidade de fazer novas amizades, a Copa Gay acaba jogando o preconceito para escanteio. Neste quesito, já se pode dizer que esses atletas merecem, definitivamente, a camisa 10.

(Foto: Reprodução)

Organizador da Copa Gay já vislumbra nova edição

O criador da Copa Gay de Futebol, Pedro Leocádio, era só felicidade com a repercussão do torneio em nível nacional, após a conquista do Prêmio Petrobras de Jornalismo. “Estamos muito felizes com toda esta repercussão”, celebra.

Leócadio conta que está trabalhando para viabilizar a próxima edição do torneio. A dificuldade principal, porém, ainda é a falta de patrocínio. “Estamos pensando na próxima edição, mas ainda é difícil, porque o torneio tem seus custos. São muitos gastos. Na primeira edição foi tudo do meu bolso”, lembra.

Apesar da ralação, Pedrita aposta firme na luta pela organização do torneio. “Tenho certeza que vamos conseguir, e este ano vamos fazer um torneio ainda mais bonito, mais organizado, porque o primeiro foi muito badalado, mas foi só pontapé inicial”, garante.

Para o jogador, a meta é continuar trabalhando pela inserção da comunidade gay por meio do esporte. “Queremos unir a comunidade, mostrar que dentro da comunidade somos pessoas importantes e lutar contra o preconceito. Não faço isso (o torneio) por mim. Eu já jogo (futebol) no meio da galera, mas quero que os outros possam jogar e ajudar a quebrar esta barreira. Muita gente já entrou em contato comigo, querendo colocar time no torneio”, conta.

> Confira esta reportagem no portal A Crítica.com.

(Foto: Reprodução)

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