Eu quero ouvir gol
O Fortaleza tem projeto pioneiro no país de acessibilidade a torcedores surdos
André Conrado ficou surdo quando tinha 1 ano de idade. Ao cair de cabeça no chão ainda bebê, perdeu a audição. Cedo ele descobriu a paixão por futebol. Em 2016, o torcedor se associou ao time de coração, o Fortaleza. As barreiras de comunicação, porém, o desmotivaram a renovar a carteirinha. Até que um projeto do clube garantiu sua volta aos estádios.
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Desde novembro de 2018, o Fortaleza possui um programa de acessibilidade a torcedores surdos. Iniciou com a tradução de Libras, a Língua Brasileira de Sinais, nas entrevistas coletivas do clube. Hoje, o Leão oferece também recepção a deficientes auditivos nos jogos na capital cearense e também um grupo de Whatsapp para informes a esse público específico.
“Na época eu não me senti contemplado, mas vejo que a coisa está mudando”, elogia André, cearense de 37 anos. Deficientes recebem do Fortaleza um desconto na adesão ao programa de sócios, mas eles desejam algo mais importante do que a vantagem financeira: o direito de compreender e ser compreendido. “Como qualquer um”, ressalta o coordenador de informática escolar.
Veja a versão da reportagem em vídeo: (Com acessibilidade para surdos)
Iniciativa pioneira
Essa acessibilidade é iniciativa do projeto Leão 100 e da Comissão de Obras, que tocam uma série de melhorias motivadas pelo centenário do clube em 2018. Além de renovar a estrutura física, a ideia é cuidar também das pessoas. “O Fortaleza dá muito valor à torcida, e não poderia deixar de fora os deficientes auditivos”, pontua Rolim Machado, 2º vice-presidente do clube.
Dessa forma, surgiu um projeto pioneiro no futebol brasileiro: todas as entrevistas coletivas após treinos e jogos na capital cearense passaram a ter tradução para surdos. Para isso, foi contratado um intérprete de Libras. Incorporado à assessoria de imprensa do Fortaleza, o profissional detalha em sinais o que os tricolores dizem aos repórteres.
“O Fortaleza dá muito valor à torcida, e não poderia deixar de fora os deficientes auditivos”. (Rolim Machado)
“O Paysandu já contou com a tradução para surdos em situações pontuais, mas de forma permanente nunca houve isso em nenhum outro clube do país”, destaca Crystonberg Silva, intérprete de Libras. Concursado com essa profissão na Prefeitura de Maracanaú, o torcedor tricolor agora se orgulha de difundir a linguagem dos surdos através da força do seu time de coração.
O serviço de tradução das coletivas do Fortaleza é disponibilizado nas entrevistas veiculadas em emissoras de televisão e nas transmissões online da TV Leão, o canal do clube no Youtube, e do Bora Leão, canal voltado para a torcida tricolor. Nelas, o intérprete fica posicionado ao lado do jogador, técnico e/ou dirigente escalado para os microfones.
Informação para surdos
Por tabela, o projeto foi contemplando outros serviços. Um grupo de Whatsapp foi criado para reunir torcedores surdos. Até o momento desta entrevista, eram 57 tricolores presentes, que recebem no celular notícias que não teriam como consumir em áudio e vídeo. “As informações sobre o time são repassadas a mim, e eu encaminho a todos eles”, indica Crystonberg.
Nos estádios, sobretudo no Castelão e no Presidente Vargas, o intérprete do Fortaleza cumpre uma outra função importante além daquela dos pós-jogos. Antes e durante, ele está ali para qualquer necessidade. “Só quem é surdo sabe a dificuldade de se comunicar num espaço público com uma pessoa que não entende Libras”, esclarece Crystonberg.
“Só quem é surdo sabe a dificuldade de se comunicar num espaço público com uma pessoa que não entende Libras”. (Crystonberg Silva)
O Fortaleza não tem dados de quantos são os deficientes entre seus 27 mil sócios, e nem o número de surdos que se associaram desde o início do projeto. O crescimento não é o objetivo primordial, salienta a diretoria. “Com certeza no futuro virão mais sócios, mas o que estamos conseguindo é a satisfação de atender aos sócios surdos”, comemora Rolim Machado, que não fala Libras, mas sabe seu valor.
Ideia a ser copiada
Faz sentido ao futebol voltar-se à comunidade surda. De acordo com o IBGE, cerca de 10 milhões de brasileiros são deficientes auditivos – 5% da população. Desses, 2 milhões (1%) são completamente surdos. No Ceará, segundo o censo de 2010, existem 500 mil pessoas com algum grau de surdez, sendo 100 mil com sérias limitações. Muitas delas, possivelmente, fãs de times.
Em 2018, a comunidade surda ganhou uma visibilidade como nunca antes no Brasil durante as eleições, quando diferentes candidatos passaram a oferecer tradução de Libras em pronunciamentos e entrevistas. Mais ainda quando a própria primeira-dama, Michelle Bolsonaro, discursou em Libras durante a posse presidencial do marido Jair.
> 10 milhões de brasileiros são deficientes auditivos, sendo 2 milhões completamente surdos.
“Provavelmente essa ideia do Fortaleza vai ser copiada, vai ser seguida. Quanto mais gente os clubes possam atingir através da comunicação, será bacana a iniciativa”, comenta o técnico Rogério Ceni, que, depois de duas décadas e meia de entrevistas como goleiro e agora treinador, pela primeira vez pôde se dirigir diretamente aos surdos em coletivas.
A Língua Brasileira de Sinais foi reconhecida como 2º idioma oficial do país em 2002. Passadas quase duas décadas, a dificuldade para os deficientes auditivos ainda é muito presente, sinaliza Crystonberg. Depois da política, quem sabe seja o futebol o próximo holofote para essa questão. Por hora, os tricolores surdos agradecem o respeito aos seus direitos.
> A Janela de Libras na reportagem em vídeo foi feita pelo tradutor e intérprete de Libras Roberto de Sousa Junior (85-98629.1634).
Serviço:
1) Quer ser sócio do Fortaleza? Visite o site sociofortaleza.com.br.
Deficientes têm 100% de desconto na adesão com acompanhante pagando integral, ou 50% de desconto na adesão e 50% de desconto na adesão do acompanhante. Planos são de R$ 79,90, R$ 54,90 e R$ 34,90 mensais.
2) Quer apoiar o projeto de acessibilidade para surdos do Fortaleza? Visite o site leao100.com.br.
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